Eu fui ouvir Aretha Franklin.

A notícia da morte da rainha do soul chegou a mim pelo sempre tão informativo Facebook e eu, imediatamente, me senti deslocada. Eu não tinha absolutamente nenhuma posição acerca de Aretha Franklin. Ah, como é péssimo não poder, nesses tempos de redes sociais, partilhar do sentimento alheio a respeito de um trending topic, de uma notícia tão bombástica como a morte de um ícone, que repercute em todas as plataformas, entre pessoas de todas as idades.

Lógico que eu já tinha ouvido falar dela. Rainha do soul, figura do movimento negro, voz maravilhosa, etc, etc. Mas era tudo muito abstrato para mim. E lá estavam todas aquelas pessoas experienciando a dor de perder Aretha Franklin enquanto eu, justo a pessoa que escreve a coluna de entretenimento, estava indiferente. Mais uma vez eu vivia um momento de total poser: como eu, toda engajada em falar cultura, nunca tinha parado para ouvir Aretha Franklin?

Bom, assim como eu tinha feito logo após a morte de Michael Jackson, em 2009, tomei vergonha na cara e sentei na frente do computador para prestigiar a obra da recém falecida. Achei uma playlist aleatória no youtube e deixei a música como fundo para minhas outras tarefas.

Depois de três ou quatro músicas, eu já não estava mais indiferente.

Creio ser humanamente impossível ficar indiferente àquela voz. E isso não é puxa-saquismo. Mas só algumas vozes têm a mesma potência da de Aretha Franklin. Não é aquele canto arrastado e meloso que se ouve em abundância nas músicas de hoje em dia. Fica óbvio ao ouvir Aretha que ela não tem medo de falar alto, de gritar aos sete ventos o sentimento que sente (e veja bem, quando digo gritar, me refiro ao grito elegante de quem tem paixão dentro de si e não à berros estridentes de quem tenta se exibir nos palcos). A questão é que, ao ouví-la, fez todo o sentido, para mim, ela ser chamada de rainha do soul, tendo em vista que soul significa alma em inglês e que, certamente, Aretha Franklin toca a alma de todos que a ouvem. OK, talvez eu esteja sendo ligeiramente puxa-saco, mas se tem alguém que merece o puxa-saquismo, é Aretha Franklin.


Reprodução: PapelPop


Aos fãs de longa data que agora vociferam a plenos pulmões que ouviam Aretha “antes de todo mundo começar a falar dela” e que possivelmente me julgam por ter virado fã “rápido demais”: parem. Essa ideia absurda de que quem gostava há mais tempo de tal artista é melhor do que aqueles que só a descobriram depois da morte é ultrapassada. Por mais trágica que sejam as circunstâncias, o importante é que, em algum momento ou em outro, todos possam ter contato com o legado dos grandes artistas que fazem parte da história da música. E justamente os fãs devem entender a magnitude dos seus ídolos e desejar que seus trabalhos sejam reconhecidos pelo maior número possível de pessoas. O círculo fechado das fandoms deixa de ser lisonjeiro para os artistas quando os fãs se tornam possessivos a ponto de querer uma exclusividade utópica com relação às obras dos seus cantores favoritos.

E destaquemos também o fato de que ninguém estava idolatrando loucamente Aretha Franklin nas redes sociais antes do dia 16 de agosto. A realidade pode até ser dura, mas é a realidade: a morte, por ironia, traz a vida artistas que estavam há algum tempo longe da boca do povo. A morte ressuscita a paixão que se apagou, com o tempo, dentro da gente e nos lembra como é bom gostar de amar a música daquele artista. A morte e sua repercussão avisam aos desavisados que ali jaz um alguém que vale a pena parar para ouvir.


E eu, desavisada, acabei por sentir a dor de perder Aretha Franklin.

Reprodução: Vogue Eu

Escrito por

Luara Rodrigues

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