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Eles surgem em dia de greve.
Nunca dão as caras; escondendo-se por trás de suas rotinas tediosas, eles vão e voltam de cabeça baixa. Muito provavelmente, com um sulco fundo no meio da testa. Olhos cansados e ligeiramente desiludidos. No entanto, em dia de greve, lá estão eles, orgulhosos: os brasileiros que querem, mais que tudo, trabalhar.
O fenômeno é real. Arrisco dizer que nem despertador é preciso para acordar o Trabalhador Reaça Médio em dia de greve: ele levanta sozinho, extasiado com a oportunidade de finalmente poder provar sua cidadania de bem. Afinal, ele precisa mover a economia. Não a de casa, mas a do país. O país que ele tanto ama. O patriotismo, então, enche o peito do trabalhador que berra aos quatro ventos: “QUERO TRABALHAR!”. É para ele que a tal mão invisível do mercado bate palmas, como quem elogia um cachorro que deita e rola.
O Trabalhador Reaça Médio gosta tanto do que faz, que faz questão de trabalhar até morrer, nas condições que forem. Se bobear, trabalha de graça, com um sorriso amarelo estampado na cara – amarelo e verde, possivelmente. No dia de greve, então, ele sai cego de casa: só o que ele vê são vagabundos, incapaz de reconhecer no rosto dos manifestantes um colega de trabalho, muito menos um amigo ou familiar. No dia de greve, ele anseia entrar no ônibus apinhado de gente e ter uma goteira pingando em si, incapaz de se mover. No dia de greve, ele, que joga lixo na rua a caminho do seu precioso trabalho, chora pela caçamba queimada, que ele nem ao menos usa. O mérito de queimar ou não queimar a caçamba não vem ao caso, entenda. A questão aqui é a absurda hipocrisia e falsa moral de quem só conhece a manifestação de domingo, de mãos dadas com a brigada militar.
O Trabalhador Reaça Médio virou gado brasileiro, que anda nas ruas de verde-amarelo, reivindicando o seu direito de ser subserviente. Foi tão bem alienado que é incapaz de olhar no espelho e se perceber massa de manobra. O gado é um elemento trágico do jogo político brasileiro: orgulhoso de ser gado, ele anda, em dia de greve, de cabeça erguida em direção ao matadouro.