Vinte e dois anos depois de sua estreia, a franquia Matrix retorna aos cinemas e, curiosamente, o tempo foi aliado e adversário desta produção.
Quando estreou em 1999, o longa das Irmãs Wachowski revolucionou o cinema, sendo pioneiro em diversos aspectos técnicos, fazendo com que, até hoje, o filme conte com efeitos especiais convincentes, apesar dos avanços que tivemos nesse período. Nas produções seguintes, Matrix Reloaled e Matrix Revolutions, ambas lançadas em 2003, viu-se toda essa inventividade sendo explorada ao máximo, o que, pra mim, é o ponto em que a franquia se mostra mais fraca. Com o talento que as irmãs têm para criar imageticamente universos fantásticos e cenas de ação magistralmente dirigidas, o ponto alto da trilogia inicial é a construção desse universo e a maneira como ele é apresentado, além da criação dos personagens e das descobertas dos seus conflitos.
Além da fantasia, o universo é rico em metáforas, reflexões filosóficas e referências bíblicas e mitológicas. Isso, ao meu ver, foi deixado de lado nos dois filmes seguintes, talvez pelo pouco tempo entre as produções, ou por quererem surfar no hype tecnológico que a obra contava. Fato é que todo conflito interno dos personagens e daquele mundo pouco se viu nas produções seguintes.
É aí que o tempo se faz aliado de Matrix Resurrections. O intervalo entre um filme e outro abre possibilidade de refrescar e oxigenar as questões trazidas no primeiro longa.
Neste, vimos Thomas Anderson (nome de Neo na Matrix), como um designer de games bem sucedido. Porém, resignado e confuso com a vida que leva, se pega questionando se aquilo que vive é real ou é algo programado por máquinas. As indagações apresentadas no primeiro filme voltam de uma forma repaginada, modernizada, o que se nota através da paleta de cores, em que o verde séptico tão conhecido dá lugar a um tom azul e aparentemente saudável.
A diretora Lana Wachowski (sua irmã Lilly não quis participar do projeto) acerta ao “requentar” os aspectos filosóficos do filme, como escolher entre a verdade desoladora e uma ilusão confortável, além de questionar o próprio conceito de escolha, que é subvertido genialmente ao final do segundo filme. Mas, percebam que usei a palavra “requentar” para descrever o que acontece. É aí que o tempo se torna um vilão. Passado tanto tempo depois do lançamento de um longa tão icônico, que foi usado de referência, que foi copiado, homenageado, citado tantas vezes pelo cinema ao longo dos anos, Matrix Resurrections falha em apresentar algo novo. A impressão que dá é que estamos vendo algo que já vimos, com uma roupa nova, mais moderna, mais atualizada. A diretora sabe disso e utiliza de metalinguagem e um humor às vezes nonsense para não se levar tão a sério, o que funciona bem e mostra um domínio narrativo incrível.
Matrix Resurrections diverte, cativa, instiga, traz cenas de luta e de ação magistralmente decupadas e coreografadas, mas, ao se tratar de Matrix, peca no quesito inovação. Pode parecer até sacanagem cobrar isso num quarto filme da franquia, porém é a sensação que passa ao público. Talvez esse seja o preço por ter colocado a régua tão acima com o filme de estreia.