Ari Aster não é um diretor simples. Seu apreço pelo estranho e pelo perturbador vai além da maneira como dirige as cenas e alcança também a escolha dos temas de seus roteiros. Percebe-se isso desde seus curtas metragens, como o extremamente desconfortante The Strange Thing About the Johnsons de 2011. Acessar lugares obscuros da psique nunca foi um problema para Aster. Pelo contrário, ele tenta, por meio de seus filmes, facilitar esse acesso.

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Depois de virar mundialmente famoso em 2018 com o excelente Hereditário e de consolidar sua autoralidade com o folk horror Midsommar, em 2019, Ari Aster retorna às telonas com um longa que permeia suas ideias há muito tempo. Beau tem medo é derivado de um curta que dirigiu e escreveu em 2011, chamado Beau. Em ambos, a premissa é praticamente igual, porém, nesse intervalo de mais de vinte anos, Ari Aster pôde, enfim, contar a história da maneira que sempre quis, com a duração que julga necessária e, claro, com um elenco muito forte, que dispensa qualquer apresentação. Além disso, ao contrário de suas obras anteriores, seu novo trabalho não conta com uma ameaça ou presença metafísica como agente do terror (demônios, possessões, rituais, paganismo), mas, com pura e simplesmente, a mente humana e sua forma de funcionar.

O longa conta a história de Beau (Joaquin Phoenix), um homem de meia idade que aparenta ter problemas de autoestima e autoconfiança, e uma relação desconfortavelmente próxima e amorosa com sua mãe, que mora em outra cidade. Aparanta porque, desde os primeiros minutos, a direção nos faz questionar se o que estamos vendo no entorno de Beau é real: ele vive em uma vizinhança caótica, com brigas e assassinatos ao ar livre, normalizados por aqueles que praticam tais atos e com uma dose extra de sencacionalismo.

A saga de Beau começa quando ele se vê atrasado para pegar um avião e visitar sua mãe. Na correria, as chaves e a mala somem na porta de sua casa. Pronto. O protagonista, que já vivia em uma espiral de medo e tensão, ganha um novo motivo para embarcar em uma derrocada psíquica.

A partir desse momento, Ari Aster mostra suas garras afiadas para perturbar e, especialmente, confundir o espectador. Acompanhamos Beau em um fluxo de consciência caótico e em uma série de desventuras com personagens tão questionáveis quanto ele, como o casal Grace e Roger (Amy Ryan e Nathan Lane) que o acolhem após terem o atropelado.

A partir do terceiro ato, somos expostos a fragmentos do passado do protagonista e da relação com sua mãe. Não espere, porém, respostas concentras que sirvam para entender os padrões apresentados por Beau.

A atuação é sempre maximizada e exagerada, o que poderia cair facilmente em uma caricatura, não fosse pelo elenco extremamente competente liderado por Joaquin Phoenix, que, mais uma vez, mostra que é um ator além da média, versátil e com uma entrega comovente ao papel. O trabalho de Amy Ryan, que transita entre uma doçura maternal e um trauma causado por uma perda familiar, é feito de forma
surpreendentemente sutil dentro do contexto de sua personagem.

Confundindo, perturbando e incomodando, seja por meio de uma trilha sonora de graves bem marcados e sons dissonantes, ou de cenas visualmente desconfortáveis, que para alguns estômagos podem ser nojetas, Aster nos coloca dentro de uma espécie de fluxo de consciência e de pesadelo de um personagem mentalmente abalado, resultado de uma relação codependente com sua mãe, que o fez desistir de ter qualquer tipo de opinião própria e de agir por si mesmo.

Veja o trailer:

Beau tem medo

4

4.0/5
Escrito por

Marco Birnfeld

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