Crítica: Nós

Após lançar “Corra!”, o diretor Jordan Peele entrou para o hall dos queridinhos de Hollywood e não é para menos: ele faturou com seu trabalho o Oscar de Melhor Roteiro Original. Conhecido por reinventar o terror trazendo fortes questões sociais, novamente em Nós, a aposta deu certo. Misturando gêneros, Peele aperfeiçoou sua visão sobre o gênero e encontrou o equilíbrio entre suas produções. Na trama, a família Wilson viaja para aproveitar as férias de verão. A mãe Adelaide (Lupita Nyong´o), o pai Gabriel (Winston Duke), a filha Zora (Shahadi Wright)  e o filho Jason (Evan Alex). Mesmo com Adelaine relutando para ir à praia, tudo ocorria bem, mesmo com seus amigos esnobes Kitty Tyler (Elisabeth Moss) e Josh Tyler (Tim Heidecker). Entretanto, a chegada de uma nova família, idêntica aos Wilsons, transforma suas vidas.

Os invasores caracterizados de vermelho são conhecidos por serem cópias dos membros da família. A partir desse momento o roteiro segue outra linha, a da brutalidade. Com cenas escuras e tensão criada pelos movimentos de câmera e trilha sonora, o suspense/terror entra em ação. Os invasores representam não somente o medo, mas predadores interiores, cópias perfeitas e, no entanto, sem alma. Pela segunda vez, Peele trouxe um elenco majoritariamente negro – uma assinatura do seu trabalho – e, ao escrever o roteiro, soube aproveitar e ressaltar as características dos protagonistas. Sempre de bom humor, com suas piadas, Gabriel é o líder da família e o seu papel como pai se faz notável. Já Zora é uma adolescente que vive em seu próprio mundo grudada no celular, mas a personagem cresce durante o filme e consegue criar um vínculo de empatia forte com o público, assim como seu irmão Jason, um menino quieto e introvertido que se mostra bem mais do que aparece.

Porém, quem esperava um protagonista masculino se surpreende, e quem esperava uma jovem em apuros assustada, se engana. São as mulheres que comandam a história e mostram sua força e inteligência. Lupita está fabulosa. Adelaide teve uma infância marcada por trauma e hoje sua família é seu porto seguro. Disposta a terminar com essa perseguição, ela se transforma em uma verdadeira guerreira. O elenco ainda conta com a presença de Elisabeth Moss, que em poucos minutos de cena mostra seu talento e versatilidade.

E como não mencionar os invasores: extremamente intimidadores e horripilantes, Peele soube desenvolvê-las com exatidão. No primeiro momento, eles aparecem com a premissa de sofrimento e morte, porém, mesmo sendo cópias, cada um apresenta  personalidade própria, diferente do seu outro eu. A trama acaba girando em torno do passado de Adelaide e para saber o que motivou essa invasão, o roteiro desconstrói aos poucos seus traumas. Uma ótima sacada. Além disso, Peele suaviza em abordar temas como preconceito e racismo. Ele utiliza a favor todo o ambiente para introduzir esses assuntos com naturalidade, até nos momentos mais tensos. Outro feito é a trilha sonora composta por Michael Abels, que traz o estilo marcante do terror e ao mesmo tempo mescla com o descontraído. Em momentos em que a música é apenas um plano de fundo, a fotografia realizada por Mike Gioulakis consegue eletrizar.

Ainda que apostando em muitas explicações finais e tendendo para uma resolução clichê, a história consegue se sustentar até o final. Peele não se prende no gênero e modifica e agrega novas camadas para tratar de uma história que vai além do afeto familiar e que busca reflexão sobre questões sociais.