O nono filme do Tarantino, ao mesmo tempo, presta homenagem a uma Hollywood idealizada do final dos anos 60 e critica parte da indústria de cinema. Para isso, ele faz o espectador acompanhar a rotina do ator Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e seu dublê — e melhor amigo — Cliff Booth (Brad Pitt). O diretor não poupa o uso da metalinguagem nesse processo e insere diversas cenas de Rick atuando. Os papéis são, na maioria, de vilões em filmes de faroeste. Há um motivo para isso: a forma como a indústria trata os atores que já passaram do auge de suas carreiras.
Paralelo a isso, somos apresentados aos vizinhos de Rick, o cineasta Roman Polanski (Rafal Zawierucha) e a atriz Sharon Tate (Margot Robbie). O longa se passa em 1969, ano da tragédia que marcou a época: na ocasião, os seguidores de Charles Manson foram até a residência do casal e assassinaram, brutalmente, a atriz e outros quatro amigos dela. Não é a primeira vez que Tarantino pega emprestado alguns elementos reais para criar suas narrativas. Aconteceu, também, com Bastardos Inglórios, de 2009. As semelhanças terminam por aí, pois Era Uma Vez em… Hollywood procura se aproximar mais do realismo, fugindo de cenas e personagens apoteóticos. Um Bruce Lee, interpretado por Mike Moh, exemplifica isso, mostrando uma faceta mais humanizada, um tanto arrogante, do ator que se tornou uma lenda dos filmes de artes marciais.
Embora os personagens sejam interessantes o bastante para garantir que a narrativa rotineira funcione, a Sharon Tate de Margot Robbie é pouco utilizada. Ainda mais, se levarmos em conta o destaque que ela recebeu no material de divulgação e, também, o potencial da atriz. No longa, ela é resumida a um totem de pureza e inocência. O mesmo não acontece com DiCaprio, que dita o tom do filme. Ele dá vida, de forma convincente, a um personagem cheio de inseguranças, sobre a própria existência e a sua carreira. Brad Pitt, embora interprete o dublê do protagonista, torna suas cenas tão interessantes quanto. Em certos momentos, o roteiro ganha alguns elementos de suspense, principalmente quando a Família Manson, como ficaram conhecidos os seguidores de Charles Manson, é introduzida ao longa.
Para reafirmar a aura da época, são utilizados diversos elementos. O cinematógrafo vencedor do Oscar Robert Richardson opta por planos ensolarados em uma Los Angeles de cores quentes. A trilha sonora repleta de clássicos dos anos 60 funciona bem e duas delas contribuem demais para algumas das melhores cenas do filme: You Keep Me Hangin’ On da banda Vanilla Fudge e California Dreamin’ na voz do cantor Jose Feliciano.
A violência característica dos filmes tarantinianos não dá as caras até o excelente terceiro ato do filme. Ela vem de formas criativas e sem preparar o espectador. A fixação do diretor por pés e matar nazistas está lá, mas, fora isso, o longa soa como algo bem diferente do resto do catálogo dele e talvez cause estranheza num primeiro momento. O desfecho surpreendente é digno de um filme tão bem construído. A sensação que temos é que a história foi contada da forma mais completa o possível, sem apressar nada até chegar ao seu fim.